Às advogadas Daniela Felix e Ariela Rodrigues
O Movimento Humaniza SC vem, por meio desta nota, manifestar solidariedade e prestar apoio às advogadas Daniela Felix e Ariela Rodrigues, tornadas alvo de inquérito policial por defender a menina de 11 anos que foi induzida pela juíza Joana Ribeiro Zimmer a desistir do aborto legal em junho de 2022, após ser vítima de estupro.
Dra Daniela Felix
Dra Ariela Rodrigues
As advogadas foram intimadas a prestar depoimento na última semana, na Delegacia de Polícia da Comarca de Tijucas, Grande Florianópolis, em um inquérito que apura suposta quebra do sigilo de justiça, após vazadas as gravações da audiência em que a juíza, acompanhada pela promotora Mirela Dutra Alberton, induzia a menina, através de questionamentos notadamente constrangedores, a esperar que sua gestação chegasse a termo. A abertura do inquérito foi motivada por uma denúncia anônima ao Disque 100, o Disque Direitos Humanos, enviada à delegacia em 28 de junho de 2022 junto com um ofício assinado por Nabih Henrique Chraim, da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos vinculada ao então Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. A denúncia também sugere a responsabilidade criminal do site The Intercept e do Portal Catarinas, “por veicular as imagens e o áudio do depoimento especial sigiloso”, e propõe a apuração da “responsabilidade parental pela situação de gravidez precoce da criança” e da “eventual responsabilidade cível e criminal da equipe médica” que realizou o procedimento.
Ao aceitar tal denúncia – visivelmente motivada pelas agendas políticas e religiosas de grupos de extrema-direita – a justiça inverte valores, acusando e fragilizando quem está a serviço das instituições democráticas e dos direitos de pessoas vulneráveis. A Lei nº 8,069 de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é clara ao determinar, em seu Art. 4º, que “é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à convivência familiar e comunitária” das crianças e adolescentes. No caso em questão, o estupro presumido de uma menina de 11 anos, pressupõe o direito da criança e o dever da sociedade em facilitar o acesso ao aborto legal, visando garantir-lhe a saúde, a dignidade, o respeito e a vida, sem os quais todos os demais direitos estariam ameaçados.
Juíza Joana Zimmer
As violações de direitos e do devido processo legal ocorridas nessa situação lamentável partiram daqueles indivíduos, instituições e grupos políticos e religiosos que, com base em dispositivos moralizantes, fundamentalistas e ideológicos, tentaram dificultar o acesso ao aborto legal, que em casos envolvendo menores prescinde de autorizações prévias justamente para que a criança não seja revitimizada e/ou tenha seu sofrimento prolongado.
Por tudo isso, o que vemos nesse inquérito é mais uma expressão do dedo inquisidor das forças reacionárias que dirigiam o país até dezembro de 2022. O Humaniza SC surgiu como instrumento de enfrentamento às práticas de ódio e violência e ao retrocesso político e social que perdura em nosso Estado e, nesse sentido, expressa seu repúdio ao inquérito contra as advogadas que, automaticamente, fere também o direito da criança vulnerável à defesa e à garantia de direitos.
Florianópolis, 22 de Maio de 2023
MOVIMENTO HUMANIZA SANTA CATARINA
Comments